Quando me perguntavam qual a motivação minha resposta era:"Religiosa".
Na época que conheci o Caminho eu estava mochilando pela Europa. Não tinha intenção de ir a lugares de peregrinação, mas o acaso me colocou no caminho de Assis e por que não ir lá dar uma olhada? Depois fui para Roma. Todavia não me interessei em ver o Papa. Tentei ir ao Capela Cistina, mas desisti porque estava muito calor, fila quilométrica e sobretudo porque eu estava de bermuda acima do joelho e mulheres não podem entrar com roupa acima do joelho. Passei por Fátima e como estava chovendo decidi continuar no trem que ia para Porto. Então não fui à Fátima. Já na França passei por Lourdes. Achei estranho aquele negócio de banhos.
Na estação de trem vi o livro do Paulo Coelho em francês. Como não havia lido em português comprei-o e comecei a ler. Logo no início do livro falava e uma cidade que eu já tinha visto o nome escrito na tabela de horários de trem e o nome de uma tal de Mme. Jeanne. Humm! Busquei os horários e vi que tinha trem de Lourdes à Saint Jean Pied-Port.
No dia seguinte fui para lá. Andei pela Rue de la Cidadelle. Parei na frente do número 55. A porta estava aberta. Mas não tive coragem de entrar. Eu não estava ali como peregrina e nada sabia sobre o Caminho. Então fiquei meio sem saber o que fazer e quando decidi voltar para Irun e seguir viagem descobri que o trem que havia me trazido só voltaria no dia seguinte às 5:00 ou às 10:00.
Tentei saber se havia ônibus para algum lugar. Não havia e até hoje não há. Na Oficina de Turismo me disseram que teria que chamar um taxi de Roncesvalles para vir me buscar. Me deram o número e o nome do taxista. Liguei e soube que custaria 170 Francos. E também soube que de lá não tinha saída a não ser de taxi ou caminhando. Estava presa em SJPP.
Decidi passar a noite ali e entrei no primeiro hotel que vi. Acho que era o único. Foi o hotel mais caro da viagem, mas no fim se tivesse ido à Roncesvalles teria gasto mais e ficaria presa lá também. Eu não tinha condições e nem estava preparada para caminhar. Não tinha roupas nem calçado adequado. O peso da mochila tb. era excessivo. Mesmo que por algum momento tenha me entusiasmado com a ideia de começar o Caminho, decidi que o faria em outro momento.
Assim acontece com muitas pessoas que estão mochilando pela Europa e descobrem por acaso o Caminho de Santiago e entram nele de paraquedas. Vi muitos jovens com esse perfil.
Segui viagem. Quando voltei ao Brasil procurei outros livros sobre o Caminho. Foi o livro Guia do Peregrino do Caminho de Santiago que me deu uma noção de como era o Caminho,com dados sobre os lugares e trechos. A edição que tenho é de 1992. Mas não recomendo pois de lá para cá muita coisa mudou.
Fui lendo esse livro que percebi que precisava me preparar para ir ao Caminho de Santiago. Que se tivesse seguido o impulso daquele dia em SJPP teria sido uma tentativa frustrada e talvez eu nunca mais quisesse voltar para lá.
Na época eu era católica e fiz um promessa de ir ao Caminho por alguém que estava muito doente.
Essa pessoa já morreu. De vez em quando me perguntava se ainda era necessário cumprir com a promessa. Nessas alturas eu já nem era mais católica.
Há alguns anos comecei a me interessar por escalada em rocha. Fiz curso e percebi que demandava de muito investimento em equipamentos e a prática dependia de estar inserida em um grupo. Então decidi me dedicar ao trekking onde também encontro oportunidades de literalmente escalaminhar montanhas. Fiz alguns caminhos longos pelo Brasil e isso serviu de preparação. Neles encontrava com alguém que estavam voltando de Santiago de Compostela. Então a lembrança da minha promessa voltava. Comecei a pesquisar sobre o assunto e a planejar, mas nunca dava para ir e fui adiando até que uma gripe que começou com o nome de suína e acabou em H1N1 e um ditador coreano lançando mísseis me fizeram mudar de planos e ir ao Caminho de Santiago.
Um comentário:
Querida JEane, acabei caindo aqui no seu blog de paraquedas, vinda do twitter da Mirella, minha prima, e acabei encontrando muito mais do que esperava! Um sonho da minha vida, fazer o caminho de Santiago, e seus relatos são muito valiosos pra mim, obrigada! deborah matthiesen
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